Friday, October 17, 2008

A racionalidade grega


Citações de Heraclito (dos Fragmentos):

27. O que aguarda os homens depois da morte não é nem o que eles esperam nem aquilo em que crêem.
41. A sabedoria consiste numa única coisa,conhecer o pensamento que governa tudo em todo o lado.
43. Não  podemos encontrar os limites da alma, por mais caminhos que sigamos, de tal modo estão tão profundamente enterrados.
49. Descemos e não descemos o mesmo rio; somos e não somos.
54. A harmonia invisível vale mais do que a visível.
55. Prefiro tudo o que se possa ver, ouvir e aprender. 
81. O que existe em nós é sempre uno e o mesmo:vida e morte, vigília e sono, juventude e velhice; pois a mudança de um dá o outro e reciprocamente.
91. Não se desce duas vezes o mesmo rio.
101. Eu procurei-me a mim mesmo.
101@. Os olhos são melhores testemunhas que os ouvidos.
109. Mais vale esconder a ignorância.
112. O pensamento é a mais alta virtude.
113. O pensamento é comum a todos.
116. A todos os homens é dado conhecerem-se a si próprios e fazer prova de sabedoria.
119. Para cada homem o seu carácter é o seu daimon.

O "milagre grego", nos primórdios do pensamento ( da descoberta da Razão)deu aos humanos os princípios essenciais da sua actividade nos variados domínios da filosofia, da história, das ciências, bem como da variedade dos géneros literários e artísticos.
Os gregos, abandonando o empirismo, souberam ir ao encontro das fontes universais de todo o Saber, libertando-se do imaginário e da tutela das magias e das religiões, colocando os problemas no plano da racionalidade e a essa luz procurando soluções e suporte para as suas criações.
É no século V a.C. que este florescimento da Razão se verifica.
Os filósofos meditam sobre o homem e sobre o universo, e nos anfiteatros representam-se as antigas lendas e mitos de fundação, como tragédias ou como comédias.Dos dramaturgos Eurípides será considerado o mais interessante (Walter Benjamin dirá que é ele o fundador da tragédia moderna).
Também nas artes plásticas se verificará um impulso de grande modernidade: racionalismo, clareza na representação,sentido de harmonia e proporção, em suma, um "esforço pelo inteligível, sentido de superação da matéria, poder de observação, gosto pelo concreto, pelo individual, pelo singular" como escreve Maria Helena da Rocha Pereira em Estudos de História da Cultura Clássica, cap.VII,  pags.563  e segs.  ed. Fundação Gulbenkian, 2006.
Como se dizia na antiga Grécia, " o que fazia com que se sentissem gregos não era a raça, mas uma mentalidade, e chamam-se helenos mais os que participam da nossa cultura, do que os que ascendem a uma origem comum".
Algo de parecido com o que nos leva a falar de cultura europeia, ou cultura ocidental, sendo as várias línguas e nações tão diferentes.

É esta mentalidade, esta maneira de olhar o mundo, e dentro do mundo o próprio homem, que levará Platão, na República, a decidir que é sábio expulsar da cidade ideal o poeta, pois o poeta, como visionário que é, perturbaria o sentido do equilíbrio que se deseja na sociedade humana. O poeta, na obra, dá largas à paixão, à emoção, mas na cidade ideal (tirânica, ao fim e ao cabo...) só predominaria a filosofia da razão.

2 comments:

Margarida Azevedo said...

É triste e actual ... Pois não sou poeta mas sistematicamente expulsa dos aglomerados 'do sistema'. Mil vezes assim ...

Sempre gostei de Heraclito, do pouco que se conhece. Havia algo sobre música. [Ou importante para determinados estudos sobre música, ethos ... Terei por aqui, mas estou cansada e não está em livro ...]

27. é e sempre foi um número do meu destino. Não só do meu :)

Cara amiga, no dia em que os meus desabafos e pensamentos a incomodarem, alerte-me por favor!

Grata,
Moriae

Henrique Chaudon said...

Amiga Yvette:
Só hoje me dei conta de seu novo blog, embora visite Literatura e Arte diariamente!
Obrigado por mais esse espaço de proveitosas leituras.